quarta-feira, 16 de julho de 2014

A convite da Liberty Fund --uma associação americana que promove dezenas de colóquios por ano pelo mundo inteiro e publica as grandes obras do pensamento político "liberal"-- passei os últimos dias relendo Alexis de Tocqueville (1805-1859), autor do clássico "Da Democracia na América" (e do igualmente magistral "O Antigo Regime e a Revolução").

Da primeira vez que viajei com ele pelos Estados Unidos, ainda estudante, devo ter entendido metade da obra (estimativa otimista). Hoje, confesso que consegui uns 75% --e simpatizei com a essencial inquietação do aristocrata francês.

A "era democrática" nascia desse lado do Atlântico. Acabaria por se espalhar pelo mundo. Mas Tocqueville, apesar de admirações mil pelo novo país, detectou na "era da igualdade" o seu problema mais marcante: como escapar às "tiranias da maioria", que poderiam ser ainda mais brutais do que as tiranias do passado?

No Antigo Regime, a tirania tinha solução: as cabeças decepadas de Charles 1º (na Inglaterra) ou de Luís 16 (na França) eram uma resposta possível. E eficaz.

Mas como fugir, na era democrática, a essas tiranias majoritárias, silenciosas, muitas vezes ignaras, que subvertem as liberdades básicas em nome de uma difusa "vontade geral" --que, por ser geral, têm sempre prioridade sobre as vozes dissonantes?

Conheço as respostas clássicas para aliviar os potenciais prejuízos: separação de poderes; eleições regulares; liberdade de expressão; fortalecimento da sociedade civil. Tocqueville tocou todos esses instrumentos.

Mas o que perturba é verificar que, para Tocqueville, nenhum desses mecanismos pode ser suficiente para evitar o dilúvio da tirania majoritária. A história do século 20 é o retrato dessa melancolia profética: será preciso recordar os ditadores que usaram a democracia para liquidar a democracia?

Só que o problema das democracias não se limita às "tiranias da maioria". Também é preciso ter em conta as "tiranias da minoria" --uma observação sagaz introduzida na discussão do colóquio por John O'Sullivan, um conhecido colunista britânico para quem um dos problemas das democracias modernas está na forma como alegadas "elites" (políticas, intelectuais, acadêmicas etc.) capturam a liberdade das maiorias.

Pode ser sob a forma de um "paternalismo soft" (o que devemos comer, beber, fumar etc.). E pode ser sob a forma de um "paternalismo hard" (o que devemos ler, pensar, que expressões usar, que sensibilidades de minorias respeitar etc.).

Escusado será dizer que as nossas democracias estão hoje dominadas por esses dois tipos de tiranias: por um lado, a tirania de populistas autoritários que conquistam facilmente a ignorância e a pobreza das massas com suas promessas ilusórias de redenção.

Por outro lado, encontramos também a tirania de uma suposta "intelligentsia" vanguardista que gosta de tratar os cidadãos como crianças --crianças que não sabem pensar, nem comportar-se, nem viver sem a tutela de um Estado "babysitter", que as embala do berço até a cova. Haverá solução para isso?

Curiosamente, Tocqueville achava que sim. E mais: considerava que essas soluções deveriam nascer no interior das democracias --e não pelo retorno reacionário a uma idade de ouro aristocrática que, na verdade, nunca verdadeiramente existiu.

Algumas dessas soluções já foram referidas: separação de poderes; liberdade de expressão; pluralismo religioso; reforço da independência da sociedade civil (a "arte de associação", como lhe chamava Tocqueville e que ele presenciou com agrado nos Estados Unidos).

Mas a mensagem fundamental de Tocqueville é que a única forma de preservar a liberdade perante a tirania passa por cultivar nos indivíduos o gosto por essa liberdade.

Ou, como o próprio escreveu num dos momentos mais sublimes da sua "Da Democracia na América", o principal objetivo de um governo virtuoso é permitir que os cidadãos possam viver sem a sua ajuda. E acrescenta Tocqueville: "Isso é mais útil do que a ajuda alguma vez será."

Passaram quase 200 anos sobre essas palavras. Curiosamente, não envelheceram uma ruga.

Fonte: 1º/07/2014 - Folha de S.Paulo
Autor: João Pereira Coutinho
Vou ao supermercado e fico pasmo com os produtos nas prateleiras. Não falo da quantidade de iogurtes, bolachas, pastas dentifrícias ou papel higiênico que me transformam no famoso burro de Buridan --o asno do paradoxo filosófico que morre de fome por não saber qual dos pedaços de feno escolher. De fato, tanta variedade paralisa qualquer um.

Falo de outro fenômeno igualmente agônico: a quantidade de produtos alimentares que parecem diretamente saídos de um consultório médico.

Um iogurte não é um iogurte, com um determinado sabor e uma determinada textura. É quase um remédio de farmácia que promete diminuir o colesterol e controlar 50 outros indicadores orgânicos igualmente importantes para a saúde do sujeito.

E quem fala em iogurtes, fala em sucos (com seu cortejo de vitaminas), batatas fritas (com reduções heroicas na quantidade de sal) e até chocolates (alguns deles prometem melhorar o fluxo arterial). Como se chegou a isto? Verdade: com a "morte de Deus" e o fim de uma vida transcendente, cuidar do corpo transformou-se na única religião dos homens modernos. De tal forma que nem a gastronomia está a salvo: antes do prazer ou da mera fome, está primeiro a saúde. Hoje, não se come mais para viver. Come-se para viver até aos cem --uma importante revolução civilizacional.

Honestamente, nem sei por que motivo não se abrem restaurantes em hospitais, com refeições cozinhadas por médicos e servidas por enfermeiros. No final, o cliente faria análises ao sangue e só pagaria a conta se tivesse o número certo de triglicerídeos.

O problema é que nem no hospital o cliente estaria a salvo. Desde logo porque é cada vez mais difícil saber o que comer: existem estudos, publicados a um ritmo demencial, que dizem uma coisa e o seu contrário. Às vezes, na mesma semana --ou até no mesmo dia.

A carne vermelha é má, defendem uns. A carne vermelha é ótima, garantem outros. Sobre os laticínios, há opiniões para todos os gostos: são puro veneno; são simplesmente insubstituíveis. E até as gorduras, que deveriam ser um inimigo consensual, parece que não são tão inimigas assim.

A revista "Time", aliás, dedicou matéria especial ao fenômeno: durante décadas, o país declarou guerra às gorduras. Que o mesmo é dizer: incluiu no Index da dieta nacional a carne vermelha, os ovos, os laticínios, a manteiga. A mensagem era simples: conservar um coração saudável implicava dizer adeus a todo esse lixo. Conclusão? Os americanos foram dizendo adeus ao lixo, optando por aves, leite magro ou cereais. Infelizmente, a mudança na dieta não os tornou mais saudáveis. Pelo contrário: o país está mais doente do que nunca.

A diabete de tipo 2 aumentou 166% entre 1980 e 2012. Os problemas do coração continuam no topo da lista --e das mortes. E, sobre a obesidade, estamos conversados: falar dos Estados Unidos é imaginar uma nação disforme de glutões disformes. Explicações? Não, a gordura não é o papão que se imaginava, explica a revista. Não entro em termos técnicos, até porque eles são demasiado gordurosos para mim. Mas parece que a gordura do peixe e dos vegetais é boa para o coração. E até a gordura "suspeita" de um bom filé (cozinhado com manteiga, claro) tem vantagens respeitáveis na limpeza do mau colesterol.

Os verdadeiros inimigos, hoje, são os carboidratos presentes nos açúcares, nos doces, nos farináceos. Isso, claro, enquanto não surgir um novo estudo a defender precisamente o contrário --ou, pelo menos, a colocar as coisas na suas devidas proporções.

E eu? Que fazer perante essa selva de alarmes contraditórios? Nada. Rigorosamente nada. Perdido no supermercado, vou retirando das prateleiras os alimentos que a ciência aprova e desaprova nos dias pares e ímpares, respectivamente.

E confesso que as gorduras continuam a ter espaço generoso na minha dieta animalesca. Não que eu me orgulhe disso, cuidado. Mas enquanto não existirem estudos definitivos sobre o assunto, prefiro seguir as recomendações da minha ilustre dra. Gula.

Fonte: 24/06/2014 - Folha de S.Paulo
Autor: João Pereira Coutinho


Leitura

A Academia Americana de Pediatria recomenda ler para o bebê desde o nascimento para ajudar a enriquecer a linguagem, racíocínio e a própria vida.

A entidade apregoa : Leiam para seus filhos desde o nascimento.

Novos estudos baixam a os benefícios da interação com os pais e os livros para antes dos dois anos,.

Saiba mais no jornal O Estado de São Paulo, edição de 29/06/14

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Indústria

As montadoras passam a prever queda de 10% na produção de veículos este ano.

No primeiro semestre a baixa foi de 16,8% em relação à igual período do ano passado. Associação do setor atribui a redução à menor oferta de crédito. Conta com uma recuperação das vendas após a Copa.

De qualquer forma o desempenho final estará longe da previsão inicial de crescimento de 1,4%. Em cosequência do freio na produção o México já  ultrapassou o Brasil no ranking da indústria automobilística. Ocupamos agora a oitava posição.

Saiba mais na Folha de São Paulo, edição de 08/07/14

Copa

Terminada a Copa podemos dizer que o balanço foi positivo. Os estrangeiros levam uma boa imagem do Brasil graças à cordialidade e alegria dos brasileiros e não ocorreram incidentes que prejudicassem a imagem do país.

É certo que ficam as obras inacabadas e as que sequer foram iniciadas e os estádios gigantescos de futuro muito incerto dada a escassez de público nos jogos domésticos. Fica de herança o Regime Diferenciado de Contratação (RDC) uma mudança na lei de licitações que facilita a fraude nas concorrências.

Quem disse que não ia ter Copa ou apostava em turbulências e desorganização durante o certame errou feio. O governo cumpriu, no geral, o manual e as exigências da Fifa e deu certo.

A decepção veio de onde menos se esperava. O sonho do hexa embalado pelo otimismo inconsistente da imprensa transformou-se num pesadelo que ainda irá nos perseguir por muito tempo.

Quanto a influência do resultado na política é esperar para ver. Agora vai começar o jogo eleitoral. Já na economia leio os jornais e fico em dúvida, tanto são as opiniões divergentes sobre o tema.

O troféu para os brasileiros ficou com a polícia que desbaratou a máfia dos ingressos. Se os peixes graúdos vão ser fisgados talvez seja querer demais nesse mar de cumplicidades e corrupção que inunda o mundo do futebol.